Carlos Mariani não depende da renda gerada pelo seu trabalho como artesão, mas precisa dela para sobreviver. Sendo um alcoólatra recuperado, Carlos, de 65 anos, precisa de um trabalho significativo para ocupar suas mãos e sua mente, e preencher seus dias. Então, quando sua esposa sai para trabalhar, Carlos desce dois andares de seu apartamento, perto de São Paulo, até seu ateliê. Lá, ele usa papel-jornal enrolado e trançado para fazer diferentes objetos, como descanso de panela, molduras, e decorar móveis, incluindo mesas, estrados de cama e baús.
Nos últimos dois anos, esse trabalho ecológico tem sido sua “rede de segurança e salvação”, diz Carlos, que gesticula para dar ênfase. “É mais do que uma forma de ganhar algum dinheiro… É uma forma de manter a minha mente ocupada e não voltar à adicção.” Ele diz que precisa ficar bem em prol dele próprio, da esposa, Albertina, que trabalha no departamento de faturamento em um hospital local, e de Isabella, a filha de 33 anos do casal. Ele não consome álcool há 15 anos.
Seus esforços criativos são apoiados pela Associação dos Trabalhadores Domiciliares de Osasco (ATEMDO), uma afiliada local da HomeNet International. A ATEMDO organiza feiras cerca de nove vezes por ano, onde Carlos e outros expõem e vendem seus trabalhos artesanais, além de oferecer oportunidades de networking, reuniões mensais e outros tipos de apoio, como oficinas. Carlos planeja participar de uma sobre redes sociais.
Falante e amigável, Carlos também é modesto e não consegue imaginar por que alguém iria querer conhecer a sua história. Ainda assim, ele se abre para relatar a sua jornada. Devido à sua adicção em álcool, ele passou três anos em uma clínica de reabilitação, mas não se interessava pelas oficinas oferecidas, incluindo uma sobre artesanato com papel. Mais tarde, ele começou a fazer visitas semanais aos Centros de Apoio Psicossocial (CAPS) enquanto tentava descobrir o que fazer da vida. Durante seus três anos no CAPS, uma enfermeira o convenceu a participar de uma oficina semanal sobre como fazer objetos e móveis decorados com papel. Carlos encontrou o seu nicho.
“Gosto de todo o processo, do começo ao fim, e gosto que algo bonito resulte dele”, disse, sorrindo timidamente. “Foi meio que genial.”

A técnica exige muito tempo. Carlos enrola tiras de jornal com cerca de 30 centímetros de comprimento e sete centímetros de largura em volta de uma agulha de tricô fina e depois gruda a ponta. Após retirar o tubo de papel ou canudo da agulha, ele trança três deles juntos. As tranças são unidas em pedaços de oito metros e, então, coladas sobre uma superfície firme e envernizada. Uma moldura pode levar dois dias e cerca de 400 canudos para ficar pronta.
Logo quando começou o trabalho, o CAPS convidou Carlos para participar de uma feira de negócios em um shopping de Osasco. Ele recebe aposentadoria pelos longos anos durante os quais trabalhou fazendo a manutenção de máquinas de escrever e calculadoras em um banco, mas fica feliz quando alguém aprecia e compra suas criações. Na feira, ele conheceu Edileuza Guimarães, presidente da ATEMDO, que o incentivou a se juntar à organização. Quando os donos de shopping fecharam as feiras, a ATEMDO negociou com a prefeitura um espaço perto da estação de trem de Osasco. A ATEMDO também organiza a segurança noturna.
“As senhoras da ATEMDO trabalham duro e ajudam de várias maneiras.”
Em 2024, Carlos participou de todas as nove feiras da ATEMDO. Seus colegas vendedores se tornaram amigos, cuidam dos estandes uns dos outros conforme necessário e se apoiam. Carlos, por exemplo, parou de vender luminárias de mesa porque não queria competir com outro vendedor, fabricante de luminárias. Carlos também vai às reuniões mensais da ATEMDO para saber das atividades.
O ateliê de Carlos é dividido em dois: metade mostruário, metade oficina. Ele aceita encomendas, mas, mesmo quando não tem um projeto específico, continua fazendo canudos todas as noites, enrolando-os enquanto assiste TV. Ele também se inspira nos trabalhos de outros artesãos e expandiu sua matéria-prima para além dos canudos. Alguns móveis são cobertos com filtros de café usados, criando um agradável efeito manchado; outros são forrados com rolhas de vinho reaproveitadas. Recentemente, a sogra de sua filha deu a ele papelão, pois imaginou que ele pudesse usar para fazer suportes decorativos para árvores de Natal. Ele disse que poderia fazer um ou dois, e ela respondeu que, se desse certo, encomendaria cem. Ele sorri e ergue as sobrancelhas.